Poema visual de Joan Brossa |
Em termos imediatos, pensando em propostas de trabalho que exercitem a capacidade de “colar” a escrita à leitura, sugerimos a reunião de textos de gêneros diferentes e de contextos culturais diversos; a roteirização de um texto durante a sua leitura; a reescritura de titulares e subtítulos com tipologias diferentes ou com símbolos gráficos. Qualquer processo de recorte e colagem implica na descoberta de um modo de construção, através do qual se reconhece a diversidade como fundamento do exercício da ética da liberdade e da solidariedade entre textos diversos em torno de um interesse comum.
Se o leitor compreende que, ao ler, recebe algo de alguém, e se, ao receber, decide fazer alguma coisa, procurará um caminho que materialize essa troca de saberes. A escrita é uma ação. Nesse sentido, relaciona-se com a ética. Diz Ari Paulo Jantsch que a escrita é uma tomada de posição. Suas colocações, apesar de voltadas apenas para a dissertação como um tipo de escrita “em situação”, pontuam a necessidade de sublinhar o dialogismo implícito na escrita de textos científicos, pois esses se realizam justamente para que outros se pronunciem. Também segundo Jantsch, é importante que o leitor se dê conta de que o sentido de um texto só acontece em referência ao real. Na impossibilidade de um texto dar conta da multiplicidade desse todo, reside o papel fundamental – e produtivo – do leitor. Ou seja: dar sentido a um texto é reescrevê-lo na linha do horizonte em que o próprio leitor encontra-se inscrito. Horizonte que também se alarga na medida em que antepara a leitura. [1]
Conversa com o Inspetor de Finanças sobre a Poesia, de Maiakovski (Capa de Rodchenko) |
Pela escrita, pode-se olhar novamente esse horizonte, guardar as coisas em nossa memória e, principalmente, relacionar-se diferentemente com a linguagem. O propósito da escrita é expandir os limites de nosso pensamento. Para Virgínia Wolf, apenas quando tentamos escrever, conseguimos saber como ler.[2] Ao escrever, apreendemos melhor o processo de exploração, a descoberta de si e do mundo apresentado pelos diferentes autores em suas obras. Certamente, ao escrever, aprendemos sobre nós próprios, mas o mais interessante é que, na medida em que essa aprendizagem se aprofunda, mais superamos a nossa visão particular, individualista em relação ao mundo, e menos nos importa a leitura e a escrita como meios para conquistar algo, seja uma maior erudição, seja um emprego ou até um bom resultado numa prova. Se a “linguagem é a casa do ser”, como dizia Heidegger, [3] leitura e escrita não podem ser apenas meios pelos quais nos comuniquemos melhor, mas deve servir também para – ao retomar o espírito de poesia na linguagem – “sermos” melhor.
Espaço de Leitura na Cidade de Deus, organizado pelo comitê Funjec com livros arrecadados na campanha Natal Sem Fome dos Sonhos |
Notas
1. Cf. Jantsch, Ari Paulo. “Concepção dialética de escrita-leitura: um ensaio. In: Bianchetti (org.). Trama e texto – leitura escrita criativa, São Paulo: Summus, 2002.
2. “Como se deve ler um livro”. In: Woolf, Virginia. O leitor comum. Seleção, tradução e notas de Luciana Viégas. Rio de Janeiro: Graphia, 2007.
3. Heidegger, Martin. Sobre o humanismo. Introdução, tradução e notas de Emmanuel Carneiro Leão, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967.
Imagens
Imagens
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http://mol-tagge.blogspot.com/2010/05/fotomontagem-fotografia-rodchenko.html
http://blogemacao.com/2010/12/espaco-de-leitura-na-cidade-de-deus.html
Bia Albernaz
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