18 de junho de 2012

Flaubert, patrono dos objetivistas!

Ernesto Sábato
        O público francês já esperava essa espécie de Cervantes que fizesse com o romantismo indigesto dos romances de amor o que aquele fizera com a novela de cavalaria. E Flaubert se dispôs ao sacrifício, não apesar de ser ele mesmo um romântico, mas justamente por isso, como um místico pode pôr uma bomba numa igreja pervertida.
       Assim surge um dos mal-entendidos mais pertinazes do romance: a objetividade. Tão pertinaz que o Nouveau Roman proclama que Flaubert é seu patrono. Que essa ilusão se propagasse aos sofisticados narradores da Paris atual, isso sim que é divertido. Mas é certo que os erros costumam ser mais pertinazes do que as verdades.
        Pobre Flaubert. O homem dizia "mes personnages imaginaires m'affectent, me poursuivent, ou plutôt, c'est moi que suis en eux"[Minhas personagens imaginárias me comovem, me perseguem, ou melhor: sou eu que estou nelas].
       Além do mais, o criador está em tudo, não somente em seus personagens: ele escolheu esse drama, essa situação, essa cidade, essa paisagem. E quando escreve: "Quant au souvenir de Rodolphe, elle l'avait descendu tout au fond d son coeur, et il restait là, plus solennel et plus immobile qu'un momie de roi dans un souterrain"[Quanto à lembrança de Rodolfo, ela o havia feito descer até o fundo de seu coração e lá ele estava, mais solene e mais imóvel do que uma múmia de rei em um subterrâneo'], é por acaso a pobre Emma que é capaz de assim descrever o cadáver de sua paixão?
Isabelle Hupert como Emma na versão cinematográfica de Claude Chabrol para o romance Madame Bovary

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