17 de julho de 2011

Toda obra literária pertence a um gênero?

Terão todas as obras relações literárias suficientemente estreitas com outras obras para que o seu estudo seja auxiliado pelo estudo dessas outras? Num dos capítulos do seu livro "Teoria da literatura", Wellek e Warren discorrem sobre gêneros literários. Abaixo, algumas de suas colocações:

Diferenças na fruição das obras clássicas e modernas induzem à revisão, se não abolição das três espécies [lírica, épica e drama]. Um conto pode aspirar à objetividade da peça, à pureza do diálogo. Um romance mistura narração e diálogo, sendo então uma forma composta.
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Gêneros não são fixos. Com a inclusão de novas obras, as categorias deslocam-se (ver o efeito na teoria do romance de um Tristam Shandy ou de um Ulisses).
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A maior parte dos gêneros remonta aos clássicos gregos e procura atender aos seguintes tópicos:
- pureza, com a provocação de um prazer peculiar, não acidental;
- hierarquia, obtida por um cálculo que dosa a mistura do social, do moral, do estético, do hedonístico e do tradicional;
- duração, medida pelas dimensões da obra; e
- acréscimo, as novidades inseridas dentro das formas tradicionais, seja pela mistura, seja pela supressão.
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Gênero é um grupamento baseado na forma
exterior (o metro e a estrutura) e na
interior (atitude, tom, finalidade).
A partir do século XVIII, os esquemas estruturais repetitivos foram desaparecendo; com o alargamento do público, diversificaram-se os gêneros; com a velocidade da difusão, as transições se deram mais rapidamente. A diversificação começou a acontecer no interior de um gênero: o gênero policial no romance, por exemplo. À classificação feita com base na forma, somou-se a classificação baseada em assuntos.
Na teoria clássica, advoga-se a pureza dos gêneros (unidade de tom, simplicidade de estilo, concentração numa emoção, na invocação do que é próprio de cada arte, na distinção dos personagens adequados de cada gênero, no decoro, na compartimentação dos estilos e dicções em elevado, médio e baixo).
Até hoje ecoa uma certa distinção das dicções:
épica e trágica, para a elite intelectual; 
comédia, para a burguesia; farsa, para o povo.
Houve um tempo em que, ao invés de ver numa catedral gótica uma "forma", via-se exatamente uma falta de forma. Isso sem falar nas diferenças culturais. Todas as culturas têm seus gêneros: a chinesa, a árabe e também a literatura medieval...
A moderna teoria dos gêneros é descritiva e não prescritiva.
Admite misturas, construção por acréscimo ou redução. 
Interessa-se em descobrir diferentes processos e objetivos literários.
O prazer de uma obra literária compõe-se de um misto de sensações
de novidade e reconhecimento.
A repetição de fórmulas é monótona;
a forma inteiramente nova, ininteligível.
Ou seja:  o gênero é constituído por um acervo de processos técnicos que o escritor pode lançar mão
e que o leitor já compreende.
Há obras que chamam atenção para o desenvolvimento interno da literatura - a genética literária (no Brasil, o exemplo mais recente é o do escritor Sergio Sant'Anna).
Rebarbarização é renovação:
o conto maravilhoso alimentou grandes obras;
a literatura pop se transformou em séria.
Andre Jolles diz que as formas literárias complexas provêm das mais simples (lendas, sagas, provérbios, rimas etc.). No romance, encontra-se o diário, o livro de viagens, as memórias, o ensaio.

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