10 de setembro de 2010

O tóquicico

mgrilo
Se você não consegue o que deseja, é melhor gostar do que consegue. Bernard Shaw
          Com seus cabelos maltratados, longos e esbranquiçados, Rui india-velha estava me explicando por que considera  a maconha um produto natural e uma homeopatia para o espírito.
          Esse vai para o inferno via barca de Caronte, comentei alto depois que me afastei dele. Por que,  pelo contrário, o tratamento do espírito exige diversos atos de coragem e muito trabalho, e corruptores como eles vivem exclamando: Longe de mim, esse trabalho!
          Mas existem outros vícios similares, e uma história de um deles relato a seguir.

Vida de poeta
          Preguiçoso mental em que só considerava a valorização da inspiração sem a transpiração, Moacizinho de vez em quando folheava poemas e prosas daqueles poetas chatos que só se alimentam das palavras pelas palavras e de si mesmos, até que finalmente se achando inspirado pelas musas soltou a seguinte frase no meio de um grupo de pessoas: “Aquele edifício parece um ranário, está cheio de pererecas gostosas!”, e de tanto repeti-la ganhou o apelido de Sophisticated Joe, que passou a usá-lo com algum orgulho.
          E num desses dias, como diz Céline, em que um fio desce das nuvens atravessando a cabeça e saindo pelo traseiro, Sophisticated decidiu apresentar sua frase ao mundo e escolheu nada-mais-nada-menos do que a porta da última cabine de um sanitário popular - murmurando que, pelo menos alguns daqueles caras tem algum momento de reflexão. L - levando uma lixa para preparar o espaço e uma régua para a letra ficar certinha, publicou sua proclama num sábado movimentado às dezessete horas e trinta e um minutos.
          Apesar de ansioso, decidiu aguardar duas semanas para voltar até sua portaeditor e o resultado das reflexões daqueles caras foi a seguinte: duas setinhas com telefones gays, algumas setinhas com epítetos difamatórios como Joe Babacão, Chupa-rola Joe e outros, e uma setinha longa até a parte inferior da porta  obrigando o nosso Joe  a se ajoelhar naquele chão imundo onde ele leu o clássico dos banheiros das escolas:
Triste vida
Triste sina
Ser poeta
de latrina,
          e esse acontecimento pode ser considerado como o término de uma fase de nosso aedo de uma frase.
          Mas com o tempo não se brinca, e muito depois vamos encontrar o nosso ex-Joe trabalhando como advogado de uma empresa e conhecido como Dr. Freitas, e como vício nem sempre é pecado ele acabou fazendo parte de uma punhado de pessoas intituladas DiPoets, vocês sabem, desse tipo de gente que imita as banalidades e as misérias dos estados de espírito deles mesmos.
***
Mike Bidlo. The fountain drawings.  Duchamp's pissoir
http://www.paolocurti.com/bidlo/bidduch.htm

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