7 de outubro de 2010

As curiosas regras que os escritores ditam

Elmore Leonard (trad. Maria Inez Pumar). Retirado do "The Guardian" - guardian.co.uk
1 Nunca inicie o livro com um texto sobre o clima. Se a intenção for somente criar uma atmosfera, e não a reação de um personagem diante do clima, não se prolongue. O leitor pode ficar propenso a “pular páginas” à procura de pessoas. Há exceções. Se por acaso você for Barry Lopez, que consegue descrever o gelo e a neve em mais maneiras do que um esquimó em seu livro Arctic Dreams, você pode falar do tempo o quanto quiser.

2. Evite prólogos: eles podem ser aborrecidos, especialmente se depois de uma introdução que sucede a um prefácio. Mas esses são encontrados de ordinário em não-ficção. Um prólogo em um romance é a história por trás da história, que você pode pular se quiser. Há um prólogo em Sweet Thursday de John Steinbeck, mas tudo bem porque um personagem no livro confirma aquilo a que as minhas regras se referem. Ele diz: - Gosto muito de diálogos em livros e não gosto que me digam qual a aparência do cara que está falando. Quero imaginar como ele aparenta a partir do modo como fala.

3. Nunca use um verbo que não seja "disse" para encaminhar um diálogo. A fala de um diálogo pertence ao personagem; o verbo é o escritor enfiando seu nariz. Mas "disse" é de longe menos intrusivo do que "resmungou", "arfou", "preveniu", "mentiu". Uma vez notei que Mary McCarthy terminava a fala de um diálogo com "ela asseverou", me forçando a parar de ler e buscar ajuda no dicionário.

4. Nunca use um advérbio para modificar o verbo "dizer"... ele admoestou gravemente. Usar um advérbio desta maneira (ou quase de qualquer maneira) é um pecado mortal. O escritor estará assim se expondo intensamente, usando uma palavra que distrai e pode interromper o ritmo do papo. Em um dos meus livros, há uma personagem que conta como escreve romances históricos "cheios de estupros e advérbios". 


5. Mantenha seus pontos de exclamação sob controle. Você tem permissão para usar no máximo dois ou três por 100.000 palavras de prosa. Se tiver a capacidade para brincar com pontos de exclamação como o faz Tom Wolfe, você pode espalhá-los aos montes.

6. Nunca use as palavras "de repente" ou "o mundo veio abaixo" ["all hell broke loose"]. Esta regra não requer explicações. Percebi que escritores que usam "de repente" [ou "subitamente"] tendem a exercer menos controle em relação aos pontos de exclamação.


7. Use dialetos regionais, "patois", com moderação. Uma vez que começar a soletrar as palavras foneticamente nos diálogos e a encher a página com aspas, você não vai conseguir mais parar. Observe o modo como Annie Proulx captura o sabor da linguagem do Wyoming em seu livro de contos Close Range.


8. Evite descrições detalhadas dos personagens, assunto que Steinbeck abordou por completo. Em Hills Like White Elephants de Hemingway, como o “americano e a garota se pareciam”? ”Ela tirou seu chapéu e o colocou sobre a mesa". É a única referência a uma descrição física em toda a história".


9. Não entre em muitos detalhes na descrição de lugares e coisas. A menos que você seja Margaret Atwood e possa pintar cenas com a linguagem. Você não vai querer que descrições levem a ação, o fluxo da história a parecerem uma fotografia.


10. Tente deixar de fora as partes que o leitor tenda a saltar. Pense nas passagens que você saltou ao ler um romance: você consegue perceber que parágrafos pesados de prosa contêm palavras demais.


Minha regra mais importante é aquela que totaliza as 10: se soa como uma composição, eu reescrevo.
Elmore Leonard, escritor de pulp fiction, western e policiais.
Editado pela Harper Collins Publishers
Filme adaptado do romance "Rum Punch", de Elmore Leonard

Nenhum comentário:

Postar um comentário